Os três camaradas, irmãos de ideologia, saíram um
dia da casa do seu pai Karl e foram, cada um por si, construir a sua própria
casinha. O Irmão ecologista resolveu construir uma casa de bambus com telhado de
colmo, uma coisa muito verde e zen, rodeada de belos girassóis, depósitos de
compostagem e painéis solares; a irmã Catarina, mais prudente, resolveu
construir uma casinha de ripas de madeira, uma coisa de verdade para gente de
verdade, que pintou de encarnado, e que, no fim, ficou muito bonita e a
Catarina gostou muito, aquele encarnado fazia, de facto, toda a diferença, era
um orgulho aquela sua obra. Por fim, o irmão Jerónimo, raposa velha, enquanto
os seus irmãos, com o trabalho já despachado, descansavam nos respectivos
alpendres falando para as televisões, envidou todos os esforços e construiu uma
casa de tijolo sem janelas, uma coisa robusta e inexpugnável, um bunker antiquado que
ninguém percebia lá muito bem. Ainda assim, e apesar das diferenças, todos viviam
felizes nas suas casinhas.
Mas um dia tudo mudou, o Lobo Costa apareceu sorridente nas
redondezas, a princípio ninguém lhe ligou muito importância, aliás, os três
irmãos nem gostavam lá muito dele, “lá vai o fanfarrão”, comentavam eles com
olhar crítico, “dizem as más-línguas que nos quer comer”... mas, apesar da má
vontade dos manos, o Lobo Costa não desistiu, foi-se aproximando pé ante pé e
acabou por abordar o Eco-Mano, afinal a casinha era um amor, construída
certamente com muito carinho, e o Lobo Costa era um lobo muito ecológico que se
interessava muito por aquelas coisas, e o Eco-Mano, baixando a guarda deixou-o
entrar. O Lobo Costa não precisou de mais nada, uma vez lá dentro, desculpando-se
com a alergia à aragem que vinha da janela da esquerda, deu um grande espirro
que, num segundo, despedaçou a estrutura da casa como se de um terramoto se
tratasse. O Eco-Mano, tremente e de olhos esbugalhados, fugiu aterrorizado e
foi pedir guarida à mana Catarina. Nem imaginas, disse o Eco-Mano, o Lobo Costa
deu-me cabo dos bambus, mas mal acabou a primeira frase, o lobo, astuto,
bateu-lhes na vidraça. Catarina, segura da qualidade da sua construção, descansou
o seu Eco-Mano, “estamos aqui bem protegidos, não te preocupes”, disse ela,” a
minha casa não foi feita às três pancadas, é de madeira e o Lobo Costa não
consegue aqui entrar”. Mas o Lobo Costa não descansou, lá de fora, sedutor, dizia
palavras doces e conciliatórias, “venham meus amigos, vamos negociar! Estas
paredes não fazem sentido nenhum, os tempos são agora de derrubar muros!” e
abrindo a sua grande boca de dentes muito brilhantes e afiados, soprou com
muita força para mostrar como se fazia, deitando assim, sem dificuldade, a casa da Catarina por terra.
Perante aquela hecatombe, Catarina e o Eco-Mano fugiram apavorados e foram
pedir abrigo a casa do mano Jerónimo, que, como é óbvio, não lhes abriu a
porta, tendo sido devorados ali mesmo, na soleira, pelo Lobo Costa que, não tendo
ficado saciado, vá de tocar à campainha da casa do mano Jerónimo de forma
desabrida, que parecia impossível terem construído ali aqueles muros, que
aquilo já não se usava há um ror de tempo, que exigia negociar a situação. E
passou horas naquilo, e depois dias e por fim meses, até que o mano Jerónimo, cansado
da situação, muito prático e diligente pôs as suas mãozinhas por baixo da porta e,
através da frincha, num gesto firme e seguro, lhe puxou o tapete de um só
golpe.