A
Tia Momó e a Tia Guida cresceram juntas, casaram e enviuvaram sensivelmente ao
mesmo tempo e, com o passar do tempo e com a convivência, apesar de serem
fisicamente muito diferentes, tornaram-se gémeas, praticamente siamesas. A Tia
Momó, anafada e de mal com a vida, vestia de preto, com o colarinho abotoado
até ao último botão e sentava-se sempre muito direita, no centro da grande sala
lúgubre e austera -que a Tia Momó não era dada a prodigalidades, coisa que,
aliás, criticava duramente- e ali ficava na penumbra, como numa recepção real
nocturna, ocupando a sua cadeira alta de espaldar de onde, de pescoço esticado
como uma girafa, dominava a Tia Guida, criatura magra, frágil e submissa, uma espécie de
galgo miniatura, que se sentava aos seus pés numa cadeirinha baixa, de criança, daquelas
da feira, pintada de azul-turquesa com uns arabescos em branco e assento em
ráfia, vestida com os seus eternos camiseiros de colarinhos à Dumbo e as suas perpétuas
calças castanhas à boca-de-sino, que usava em plena década de noventa para
provar à Tia Momó, que, também ela, era uma pessoa desprendida e poupada.
Viviam num mundo lá
muito delas, onde ninguém se atrevia a entrar, com medo de, num repente, ser
escorraçado pela Tia Momó, que era uma pessoa de muitas opiniões e princípios,
que alardeava amiúde, uma pessoa de convicções muito fortes, muito recta, muito
íntegra, de uma grande moralidade, uma força do bem que fazia gala na sua
frontalidade; era uma pessoa muito frontal a Tia Momó e, por isso mesmo, melhor
que as outras. Tudo confirmado pela Tia Guida que estava ali para isso mesmo,
para, sempre que a circunstância o exigia, arreganhar os seus pequenos dentinhos assustadores. Tinha-se em muito boa conta a Tia Momó, e,
talvez por pairar sempre acima da Tia Guida no seu grande cadeirão de costas
altas, transformou-se numa espécie de Cavaco Silva antes do seu tempo: a Tia
Momó nunca se enganava e raramente tinha dúvidas. Se a Tia Momó dizia alguma
coisa, mesmo que ostensivamente desagradável e agressiva, logo a Tia Guida, com
a sua voz fina e sumida, a secundava, que sim senhor, tinha toda a razão, “onde
é que já se viu?!, no fundo a Tia Guida estava ali para dar risadinhas de
desprezo quando era caso de dar risadinhas de desprezo e para estender uma mão amiga
e enxofrar-se com as graves afrontas que a Tia Momó entendia ter sido alvo,
porque, na verdade, tudo o que não encaixava nos seus cânones pré-definidos era uma afronta para a Tia Momó. No entanto, se a Tia Guida, lá em baixo, na sua
cadeirinha, ousava piscar os seus olhinhos de morcego e abrir a sua pequena
boquinha, a Tia Momó também intervinha, não para a secundar, como é evidente, mas
para a fazer ver que estava ali para controlar todas as suas palavras, para
garantir que não saía da linha que ela, tão habilmente, lhe havia marcado no
decorrer dos anos.
Era uma relação estranhíssima, a da Tia Momó e da Tia Guida,
uma relação de que ambas dependiam e se alimentavam e de onde tiravam as forças
para encarar de frente um mundo injusto e imoral, como se estivessem sentadas num automóvel, as duas, lado a lado, ainda
que em diferentes níveis: uma na cadeira de cima, outra na cadeira de baixo.
Eu gostava era de ter conhecido os respectivos maridos ( ou deverei dizer mártires?)
ResponderEliminarBelíssimo post.
Morreram novos... I wonder why... :D
Eliminar:DDDDDDDDDDDDDDDDDD, Palmier!
Eliminar:DDDDDDDDDDDDD
EliminarTadinhos, pá!
Eliminarc'est la vie! :D
EliminarIsto é verdade? Se é, começo finalmente a perceber algumas das publicações que por aqui aparecem. Esta família é muito estranha.... e ainda bem!!
ResponderEliminarFantástica história, parecem personagens de um filme, as tias Momó e Guida.
Ao nível de Fellini! :D
EliminarAdoro as suas histórias!
ResponderEliminar:)
EliminarAhahahahahahahah
ResponderEliminar(era só isto)
:)
EliminarQue lindo texto =)
ResponderEliminar:)))
EliminarUm dia, contudo, a tia Guida usou calças à boca de sino 😊
ResponderEliminarTempos houve em que foi moderna :D
EliminarPossas pah tu até sabes escrever, nem gaguejaste nem nada ihihihih
ResponderEliminarIsso era no tempo em que as mulheres não faziam nenhum, só cosiam meias :)
:)
EliminarAlimentavam-se do sangue dos outros! Havia outros, certo?
ResponderEliminarOlha que se calhar, lá para dentro... nunca se sabe :D
EliminarPois eu não gosto destas histórias. Mal escritas e pirosas , pirosas !
ResponderEliminarMas gostos não se discutem , não é assim que o povo diz ?
Ok.
EliminarTia Mómó?
EliminarAhahahhahhahahahhahahhahahhahahahhahahhahahhahahha
EliminarBack from the grave! :DDDDDDDDDDDDDDDDDD
Adorei as tias :)
ResponderEliminar:))))
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